Programar a logística, ok. Equipamento fotográfico, ok. Capa de chuva e plásticos para cobrir a câmera, ok. Tudo pronto para encarar horas e horas de Interlagos na 3ª edição das 6 Horas de São Paulo. Ou melhor, quase tudo: esqueci o protetor solar.
A sexta-feira chegou e, finalmente, depois de mais de um ano e Interlagos fechado para reforma, eu estava pronto para ver os carros que, na minha opinião, são as máquinas mais fantásticas que rodam nesta Terra. Hora de reencontrar os camaradas de pista e seus “olhos que tudo vêem” e conferir como ficaram as melhorias feitas a pedido da F1.
O dia começou agitado e logo o Porsche GT3 #34 de Maurizio Billi veio desgovernado da reta dos boxes para estrear o softwall.
Nada muito sério. Incrível ver como a nova parede funciona jogando água para todo lado e amortecendo uma paulada que seria bem mais séria na barreira de pneus.
Logo depois foi a hora de ver ao vivo, pela primeira vez, o outro Porsche, o 919 com um “motor de Fusca” e outro elétrico. Logo os híbridos pareciam estar fora do tempo e espaço real. Na saída da segunda perna do “S” disparavam na retomada em direção a reta oposta engolindo a Curva do Sol. Até o “Mr. Le Mans”, Tom Kristensen, que estava se aposentando, veio conferir como seu Audi #1 ficava bonito no asfalto novo de Interlagos, com a bandeira do Brasil no spoiler dianteiro.
Na pista, Lucas Di Grassi estava à vontade correndo em casa.
Mas os campeões nipônicos da Toyota também trouxeram seus LMP1
Então todos pararam para ver a majestade passar. O primeiro campeão, Emerson Fittipaldi em sua Ferrari laranja, mostrou que não perdeu o ritmo mesmo com 67 anos, e deu aos mais jovens o privilégio de vê-lo correr.
Fernando Rees começava sua batalha heróica, fazendo rugir o V8 de seu Aston Martin #99 na saída dos boxes e me deixando a ouvir sinos dentro da cabeça.
Torrado do sol que pegou muitos de surpresa ia me preparando para voltar para casa e contar as horas para voltar para Interlagos, mas sem antes registrar essa cena no mínimo estranha do carro #47 da Oreca, pilotado por Matthew Howson, Richard Bradley e Alexandre Imperatori.
O sábado chegou junto com o primeiro dia de visitação nos boxes, onde pudemos ver até as entranhas dos carros. Emerson Fittipaldi, Lucas Di Grassi e Fernado Rees saíram para cumprimentar o público, dar autógrafos e tirar fotos.
E quando menos se esperava, os grandes volantes regionais do Marcas e Pilotos Paulista entraram na pista para que todos que ali estavam se amontoando entre os astros de Le Mans pudessem ver o automobilismo que – faça chuva ou faça sol – está o ano todo em Interlagos.
Enquanto isso, no “lajão” do Jan Balder, um verdadeiro museu de Opalas de competição entre stands da Força Aérea Brasileira e os novos carros da F-Vee com motores Zetec.
O dia passou voando e quando percebi já tinha dormido, acordado e estava novamente em Interlagos.
A Porsche Cup abriu o domingo com uma largada cheia de carros que mal cabiam na pista, disputadíssima!
Mais uma visita aos boxes, dessa vez parecendo a 25 de Março no dia 23 de Dezembro.
E os carros do WEC vão para pista fazer o grande show.
Enquanto se alinhavam na reta dos boxes, todas as pessoas de Interlagos voltaram seus olhares para os céus. Os grandes Ases da Esquadrilha da Fumaça se aproximavam em sincronia perfeita. Homens, mulheres e crianças boquiabertos ao verem os Tucanos da Força Aérea riscarem o azul na curva da Junção, para depois retornarem passando entre as antigas curvas 1 e 2.
Mas o show da FAB não havia terminado, pois os bravos paraquedistas desciam para pousar no solo sagrado de José Carlos Pace.
Todos estavam na máxima ansiedade e os carros ligaram os motores, saindo vagarosamente atrás do safety car, desfilando pelo asfalto, sumindo e aparecendo pelo relevo do circuito. Todos olhando para a Junção onde surge o grid, tenso, segurando o acelerador até que é dada a largada!
Depois de uma hora de corrida, o LMP2 #26 da G-Drive, guiado por Olivier Pla, teve problemas no freio e bateu forte quase no mesmo local aonde o Porsche havia batido na sexta-feira. Seus companheiros de assento, Roman Rusinov e Julien Canal, se desesperavam ao ver o carro que liderava a categoria, agora sem chances de pódio. Do outro lado, festa no Oreca, que só precisaria terminar a corrida.
Depois de colocado tudo em ordem a corrida seguiu em frente. Toyota e Porsche não davam moleza na pista enquanto a Audi espreitava mais atrás. Problemas de câmbio no carro de Emerson fizeram com que ele perdesse posições e consequentemente as chances de pódio.
No Porsche #20 um problema mecânico fez o carro de Timo Bernhard, Mark Webber e Brendon Hartley perder potência. Bom para Sébastien Buemi – que dividiu o Toyota #8 com Anthony Davidson – que passou voando na reta oposta.
Nada se definia, não havia favoritos. Lucas Di Grassi, Loïc Duval e Tom Kristensen com o pé direito pesado no Audi #1. Romain Dumas, Neel Jani e Marc Lieb mantinham uma liderança sólida, porém sem garantias, no Porsche 919 #14, enquanto eram perseguidos pelo Toyota #8.
No meio da briga de foice das categorias GT, Fernando Rees não largava o osso na batalha de Aston Martins e Porsches 911. Fernando mal deixava seus companheiros Alex Macdowall e Darryl O’Young darem algumas voltas e já voltava para o carro.
E foram se seguindo as paradas nos boxes para trocas de pilotos. Tudo em perfeita sincronia.
E a disputa se intensificava com o Aston #99 de Rees contornando as curvas lado a lado com o 911 #92, de Jörg Bergmeister e Richard Lietz. A arquibancada ia a loucura com a disputa, enquanto os carros disputavam cada centímetro do asfalto de Interlagos, até que os dois vieram porta com porta contornando o “S” em um balé infernal do esporte motor, e Bergmeister acertou a lateral de Rees. Os dois carros se enroscaram na nova área de escape. Desespero geral da torcida que empurrou Fernando Rees por cinco horas.
A corrida seguia pegando fogo, quando de repente, safety car na pista. Mark Webber marretou com gosto o muro da subida do Café, levando junto a Ferrari #90 pilotada por Matteo Cressoni. A prova chegou ao seu momento mais tenso. Um silêncio aterrorizante pairava pesado em Interlagos, enquanto o telão mostrava no replay o 919 #20 sendo rachado ao meio pela força do impacto. Médicos e carros de segurança corriam para o local do acidente. Os fiscais de pista agiram rápido para apagar um princípio de incêndio. Finalmente os médicos tiraram Webber de sua armadura de fibra de carbono e o Australiano mandou um “joinha” para o público avisando que estava bem.
Faltando apenas meia hora para o cronometro zerar, não houve mais tempo para arrumar a pista e a corrida terminou atrás de safety car. Romain Dumas, Neel Jani e Marc Lieb comemoraram a primeira vitória da Porsche com um LMP depois de quase três décadas, seguidos de Anthony Davidson e Sébastien Buemi no Toyota TS040 #8 comemorando a conquista do campeonato do WEC, e Lucas Di Grassi, Loïc Duval e Tom Kristensen no Audi #1, completando o pódio da geral.
Em baixo da chuva de champanhe, os três carros estavam belíssimos, metralhados de borracha, como tem que estar um carro de endurance.
A noite caiu aos poucos anunciando o final das 6 Horas de São Paulo, somando mais um capítulo à história do grande personagem do final de semana, Interlagos, onde o sonho da velocidade é real.
Agora nos resta esperar até 2016 para ver o novamente o circo da ACO. Nos vemos lá!
Fotos:
Ricardo Varoli